Neste país de brandos costumes, do constrangimento, do medo de assumir-se, do ser mais fácil criticar do que fazer, António Ferrera protagonizou um dos momentos mais bonitos da despedida de José Luís Gonçalves: Sacou perante a passividade de aficionados e quadrilha o seu companheiro e alternante desta noite aos ombros pela Porta Grande do Campo Pequeno... algumas vezes aberta em momentos de menor significado.
Fim do mês de Agosto com muitos emigrantes já de regresso ao trabalho e a fatalidade de um país onde, pese a teimosia de alguns, o toureio a pé não tem expressão, o Campo Pequeno não encheu (meia casa forte). Não estava a televisão ou as revistas do jet-set, faltou o público da sombra, onde calcule-se, costumam tomar assento muitos daqueles que andam por Sevilha, Badajoz, Mérida ou Olivença.
Dois touros de Passanha. O primeiro de grande nobreza e som que João Moura aproveitou em especial com o Castella, fazendo gala dos seus recursos e conhecimentos do touro e dos terrenos. Galopes a duas pistas, invertendo por dentro para continuar desta vez, com a montada com a cabeça não pelas tábuas mas para dentro. Cites de largo para encurtar distâncias e deixar os ferros para todos os gostos.
No segundo, que tinha problemas de locomoção nos quartos traseiros, sacou o Merlin que, com a sua espectacularidade, chegou ao público para fechar uma presença mais na primeira praça do País desta primeira figura do toureio mundial. Goste-se ou não do seu estilo mas sempre generoso, em "maestro e empolgante.
Os forcados do Aposento da Moita, comandados por Tiago Ribeiro, cumpriram perante os “Passanhas” ao realizarem duas pegas à segunda tentativa.
O ganadeiro Filipe Falé enviou quatro touros para a lide a pé. O primeiro do lote de José Luís Gonçalves teve muita classe, sobretudo pelo piton direito, o que permitiu o toureio de mão baixa, templado e com essa estética deste toureiro que o “país taurino” nunca mereceu. Séries templadas e ligadas, rematadas com toureiria eram para deixar roucos os aficionados ao gritarem olés. Ligou ainda muletazos profundos pela esquerda mas, na realidade, o pitón do touro era o direito. Duas voltas ao ruedo lisboeta para o toureiro nascido em Angola exigiu o público posto de pé a aplaudir.
Mais reservado, servindo mas com menos qualidade o segundo e último da sua carreira (Encarregado nº 42 de 522 kilos), em que José Luís Gonçalves deixou dito que não foi, apenas e só, um toureiro de arte, um toureiro com pellisco mas que, quando necessário, era toureiro para pregar o arrimón, colocando-se nesse terreno de cercanias onde espremeu o de Filipe Falé, em especial com aqueles sentidos naturais.
O seu alternante, António Ferrera, toureiro estremenho feito em Portugal, com o corpo cosido a cornadas, por essas praças do Planeta dos Touros, aproveitou o primeiro mais potável para dar ao povo aquilo que o povo gosta: espectacularidade com toureiro variado de capote, tércio movimentado de bandarilhas e séries para o conclave com a muleta. No segundo, Ferrera mostrou porque se mantêm ao longo deste anos em muitas das principais feiras de Espanha. O touro não rompia para a frente, ficava-se e ponteava no capote. Depois do tércio de bandarilhas porfiou e, aos poucos, foi-lhe alongando os muletazos e o touro começou por seguir a muleta até ao fim. Seguiram-se as séries com mais qualidade pela mão esquerda. Depois da sua merecida volta veio o detalhe: sacar José Luís Gonçalves aos ombros pela Porta Grande do Campo Pequeno.
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António Ferrera saca a ombros pela Porta Grande José Luís Gonçalves que se despediu do toureio |
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