O touro Romero a comer à mão |
As fotos constituem como que o arquivo das nossas
recordações, sobretudo daquelas que nos são mais próximas.
Para nós, aficionados, as fotos antigas, em especial
aquelas cujo sortilégio do preto e branco nos fazem recordar tempos idos, tempos
em que a vida decorria mais lenta e os pequenos detalhes não nos passavam
despercebidos.
Essas fotos trouxeram-me à memória os tempos áureos da
Barroca d’Alva, em que José Samuel Lupi estava no auge da sua carreira como
cavaleiro tauromáquico.
Como se de um “maletilla” se tratasse, calcorreava o
caminho que separa o Montijo da Herdade da Barroca, cortando caminho através do
clandestino Bairro do Areias, um aglomerado de construções sem plano nem regras
que imperavam nos anos sessenta/setenta.
As ferras, as tentas e os treinos eram como que a
faculdade onde bebia os conhecimentos vindos de profissionais e aficionados de
pró. Nos burladeros da pracita de tentas eram frequentes as presenças do Dr.
Branco (pai do produtor Paulo Branco), dr. Mendes de Almeida, Nascimento, Balé,
João Carlos Piteira assitindo aos treinos de José Samuel Lupi, sempre
coadjuvado pelo António Gregório e Rogério Amaro.
Jovens aspirantes a toureiros, bandarilheiros ou simples
aficionados sempre tinham uma palavra amiga do engº Lupi e a sua autorização
para alí permanecerem, desde que se comportassem devidamente.
Era frequente, no corredor da quinta, assistir-se ao
“acosso y derribo” com a participação de Álvarito Domecq, Fermín Bohórquez,
Manuel Vidrié ou simples “garrochistas” do país vizinho. Respirava-se “toreria”
e “afición”, enfim, o ambiente de tempos idos e que hoje recordamos com
nostalgia. Perdura apenas a amizade que foi cimentando ao longo dos anos com o Luís Lupi, que chegou a tourear como amador.
Dessas imagens retidas, não em fotos mas na memória de
aficionado, recordo uma que verdadeiramente me impressionou na altura. Nos
currais onde se procedia aos embarques das corridas, estava um dia apartada uma
para Espanha, quando a certa altura se abre uma das portas e por ela entre um
jovem, cuja idade andaria entre os catorze/quinze anos. Na mão, levava umas
quantas ervas, possivelmente acabadas de colher. Dirigiu-se com passos seguros
para junto dos toiros, um deles parecia ter reconhecido o intruso, levantou a
cabeça de cornadura imponente e esperou. Eu e os meus companheiros de
“aventuras” taurinas, sustivemos a respiração e os nossos corações apertaram-se
perante tal ousadia. Afinal, o toiro e o jovem eram velhos conhecidos. O rapaz
falou-lhe de forma terna. O toiro, qual cachorro, preparava-se para as
habituais carícias que este lhe proporcionava. O rapaz chamava-se Vasco Piúça,
hoje homem maduro, julgo que vive no México. O toiro não recordo o nome, só sei
que foi bravo e nobre. Bravo pelo seu encaste, porque da sua nobreza fui
testemunha desta cena que descrevi e presenciei … e que me marcou como
aficionado. Imagens de tempos remotos…
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