segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Ponce, não te retires nunca

Não resisti e tenho que compartir este belíssimo texto do escritor e homem da cultura espanhola, como é Fernando Sánchez Dragó, sobre Enrique Ponce e toda uma parafernália de citações que nos trazem à memória figuras do toureio e do mundo do cinema como Paco Rabal, nessa inolvidável criação na série Juncal que, à hora de passar na televisão, deixava Sevilha meio deserta.

 Fernando Sánchez Dragó


¿Mortal e Rosa? Inmortal e Tigre? Não. Juncal e Ponce. Parafraseio estes títulos para honrar a dois amigos e, ao mesmo tempo, a alguns mais. Obrigado à vida, que me os colocou em sorte. Denotador desta coluna, que não traz demora, porque a amizade não é valor parecido, foi a boa nova, recebida a 3 de Dezembro. De que Ponce tinha dado uma conferência no Circulo Bienvenida de Quito depois do triunfo por montera na Feira da cidade. Abriu-se de capa esse sábio com uma frase três vezes verdadeira. Nasci toureiro, disse: sou toureiro e sinto-me toureiro! Olé! Ninguém lhe levará a mal e eu menos do que ninguém, pois invejo-o primeiro, admiro-o em segundo e dou fé do terceiro.
Raras sincronias são, Enrique, as que me levam a escrever isto. Faço-o no país, longínquo, de onde me feriu a notícia da morte de António Bienvenida e do suicídio no Equador, onde tu triunfaste, de outro toureiro, cujo nome parecia capicua: Domingo Dominguín. Foi esse cronópio meu amigo quando militávamos, cada um a seu modo e ambos livres, no Partido Comunista.
A Bienvenida nunca lhe falei, mas durante muitos anos segui-o, porque era, junto a Ordóñez, o meu matador favorito. Vi-o tourear (ou não fazê-lo, pois a lide torceu-se-lhe e não houve glória, senão pena) no dia da sua retirada em Vista Alegre, quando Paula ascendeu aos céus convertido no anjo de outro Rafael: seu conterrâneo Alberti. Mas não são essas, Enrique, as únicas sincronias. Estava eu voltando a ver, quando soube da tua passagem por Quito, nada menos que Juncal. Esse adjectivo, em caló (cigano), significa esplêndido. Disse-o Búfalo? Porque não repõem aquela telesérie para que os antitaurinos se apeiem do burro com divisa assinalada ao que se subiram?
Foi outro maestro e amigo, Jaime Armiñán, quem a dirigiu, e um amigo e maestro, Paco Rabal, quem lhe colocou rosto e coração. Aquele mineiro de Águilas era tão bom como o seu parente de Assis, tão cigano como Paquiro e Frascuelo quando saíram do Café de Chinitas, tão simpático e tão “golfo” como Domingo, tão nobre como os touros que investem por direito e um actor capaz de pôr a pele de galinha à estátua de Manolete. Todos eles, Enrique, menos Paula, já me morreram, mas a tua muleta e o teu estoque aliviam-me de tanta perda. Não te retires nunca. Passará muito tempo para que volte a nascer um toureiro tão cabal, tão Juncal, tão Dominguín, tão Bienvenida, tão esplêndido, como tu…


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