sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

As Tertúlias Tauromáquicas em Portugal (Parte I)

Este é um artigo de opinião e despretensioso, que eventualmente pode conter imprecisões, cuja finalidade é contribuir, de alguma forma, para a divulgação da Festa que amamos e defendemos.

Que eu tenha conhecimento, não há nenhum estudo académico ou mesmo jornalístico que aprofunde a existência das Tertúlias Tauromáquicas em Portugal. Há sim, um ou outro olhar mais ou menos atento sobre este tema, publicado em jornais ou revistas da especialidade, mesmo assim, abarcando um universo muito restrito.
Para nos situarmos devidamente, será bom começarmos por definir o termo Tertúlia que nos diz ser: “na sua essência, uma reunião de amigos, familiares ou simplesmente frequentadores de um local, que se reúnem de forma mais ou menos regular, para discutir vários temas e assuntos”. Entre estes temas e assuntos, situa-se, de facto, a tauromaquia.
Na nossa vizinha Espanha, esta forma de reunião de aficionados aparece com o nome de Peñas Taurinas, muito antes de aparecerem em Portugal as tertúlias formalizadas, que mais não são do que grupos de aficionados que se cotizavam entre si para apoiarem quer toureiros locais como de expressão nacional.
É em determinadas épocas importantes do toureio que os intelectuais de então se acercam a este mundo e podemos citar, entre outros, Ortega y Gasset, Manuel Machado, Alberti e o poeta que cantou nestes versos o mundo dos toiros como nenhum outro, como foi Frederico Garcia Lorca.

Às cinco horas da tarde.
Eram cinco da tarde em ponto.
Um menino trouxe o lençol branco
às cinco horas da tarde.
Um cesto de cal já prevenida
às cinco horas da tarde.
O mais era morte e apenas morte
às cinco horas da tarde.

O vento arrebatou os algodões
às cinco horas da tarde.
E o óxido semeou cristal e níquel
às cinco horas da tarde.
Já pelejam a pomba e o leopardo
às cinco horas da tarde.
E uma coxa por um chifre destruída
às cinco horas da tarde.
Os sons já começaram do bordão
às cinco horas da tarde.
As campanas de arsênico e a fumaça
às cinco horas da tarde.
Pelas esquinas grupos de silêncio
às cinco horas da tarde.
E o touro todo coração ao alto
às cinco horas da tarde.
Quando o suor de neve foi chegando
às cinco horas da tarde,
quando de iodo se cobriu a praça
às cinco horas da tarde,
a morte botou ovos na ferida
às cinco horas da tarde.
Às cinco horas da tarde.
Às cinco em ponto da tarde.

Um ataúde com rodas é a cama
às cinco horas da tarde.
Ossos e flautas soam-lhe ao ouvido
às cinco horas da tarde.
Por sua frente o touro já mugia
às cinco horas da tarde.
O quarto se irisava de agonia
às cinco horas da tarde.
A gangrena de longe já se acerca
às cinco horas da tarde.
Trompa de lis pelas virilhas verdes
às cinco horas da tarde.
As feridas queimavam como sóis
às cinco horas da tarde,
e as pessoas quebravam as janelas
às cinco horas da tarde.
Ai que terríveis cinco horas da tarde!
Eram as cinco em todos os relógios!
Eram cinco horas da tarde em sombra!

Vieram depois pintores, cineastas e escritores que deram uma outra dimensão e divulgação ao toureio. Sobretudo com Ernest Hemingway, o jornalista e escritor, que escreveu o romance “Por quem dobram os sinos” e que foi prémio Nobel de Literatura em 1954.
As Tertúlias Tauromáquicas em Portugal tiveram o seu início de forma espontânea e sem estarem constituídas estatutariamente, em espaços como cafés, restaurantes, clubes ou ateneus, e só aparecem com identidade jurídica nas primeiras décadas do passado século. Há no entanto notícias no Fórum de Genealogia que nos dizem, e citamos: “que o Real Clube Tauromáquico foi fundado em 1892 e não é feita qualquer referência a uma "refundação" posterior, o que não surpreende pelo facto de não se tratar de uma história detalhada do Clube mas tão só do seu enquadramento com a conhecida paixão do Rei D. Carlos pelos toiros e pela sua própria ganadaria. Mas essa refundação terá eventualmente acontecido – depois de 1910”. Segundo revela Luis Filipe Marques da Gama, o clube contou desde a primeira hora com o empenho do Dr. Carlos Zeferino Pinto Coelho, então Director da Companhia das Águas de Lisboa e foi o escritório de seu filho Duarte Egas, no Largo do Carmo, que serviu de sede provisória. Em 1 de Dezembro de1891 foi enviada uma circular para divulgação e angariação de sócios, sendo a comissão promotora presidida por Vitorino de Avelar Froes, que foi cavaleiro tauromáquico.
Essa circular era ainda assinada por Manuel e Francisco Figueira Freire da Câmara, D. Simão Luis de Sousa Coutinho, João Fletcher Júnior, João de Saldanha Ferreira Pinto, Manuel de Castelbranco, Ruy Rebello de Andrade, Jorge Rebello da Silva, Ayres d' Ornellas de Vasconcelos, António Perestrello de Vasconcellos e Duarte Egas Pinto Coelho.
A 9 de Janeiro de 1892, na sala de sessões da Assembleia Geral da Companhia das Águas de Lisboa, estando presentes 63 aficionados que constituíam a comissão promotora do clube, foi eleito Presidente da Assembleia o Dr. Carlos Zeferino Pinto Coelho, na ausência por motivos de doença de Vitorino de Avelar Froes, que presidia à referida comissão.
No dia 12 do mesmo mês, reuniu-se pela primeira vez a direcção, sendo eleitos para presidente José Pinheiro, vice-presidente o Dr. Carlos Zeferino Pinto Coelho, Aires d'Ornelas de Vasconcelos (Secretário), José Ribeiro da Cunha (vice-secretário), Augusto Gomes de Araújo (tesoureiro), Manuel Figueira Freire da Camara (vice-tesoureiro) e vogal o Dr. Duarte Egas Pinto Coelho.
Em 14 de Janeiro de 1892 foi arrendado à Viscondessa de Silva Carvalho um andar na Rua de São Francisco (actual Rua Ivens) e ainda hoje aí se mantém”.
Fica assim em breves traços a história daquela que se pensa ter sido a primeira Tertúlia legalmente constituída em Portugal.(...) continua

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